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A importância da arbitragem privada para fins de indução e fomento de investimentos no Brasil

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A IMPORTÂNCIA DA ARBITRAGEM PRIVADA PARA FINS DE INDUÇÃO E FOMENTO DE INVESTIMENTOS ESTRANGEIROS NO BRASIL


Eveline Gonçalves Denardi

Rodrigo Goes de Queiroz

Rubens Baldassare Gonçalves Van Moorsel Filho


Resumo: A arbitragem tem ganhado cada vez mais espaço na solução de conflitos empresariais, uma vez que o mercado tem reconhecido sua melhor adequação às exigências da competição no ambiente econômico. Essa escolha pela arbitragem acarretou em um aprimoramento das bases legais que servem de alicerce ao seu funcionamento, tornando-a ainda mais segura e eficiente aos seus usuários na experiência brasileira. Assim, a previsibilidade de um processo arbitral sólido gera confiança aos investidores estrangeiros, os quais percebem um terreno juridicamente favorável para uma boa alocação de recursos. O presente trabalho analisará o planejamento estatal sobre a organização da atividade econômica, sendo ressaltadas as características que tornam a arbitragem privada uma ferramenta importante na atração de investimentos estrangeiros para o país. Ademais, o artigo que aqui se apresenta tem um viés exploratório e descritivo, estando ancorado em uma abordagem qualitativa, a qual partiu da análise de documentos e de observações da realidade que foram confrontados com a recente doutrina sobre o tema e a legislação vigente.

Palavras-chave: Arbitragem. Adequação na solução de conflitos. Atratividade de investimentos estrangeiros.


INTRODUÇÃO


As relações econômicas sempre demandaram o julgamento de disputas entre empresários por um julgador técnico, o qual tivesse conhecimento profundo da área em que a controvérsia houvesse emergido, bem como a confiança das partes em sua decisão. Assim, a arbitragem foi o instituto criado para levar esses conflitos ao conhecimento de um terceiro técnico, desvinculado das amarras estatais e escolhido pelas partes para decidir sobre o caso.

Na experiência brasileira, embora a arbitragem estivesse prevista no ordenamento jurídico desde a constituição imperial, muitos doutrinadores (SOMBRA, 2011, p. 264) afirmam que o instituto não passaria de letra morta ou de uma prática de mercado que findaria em um negócio jurídico comum, passível de ser rediscutido no Poder Judiciário quando do seu término.

A inexistência de uma legislação específica sobre a arbitragem fragilizava por demais o instituto no sistema jurídico pátrio, sem contar que tornava a resolução da lide ainda mais dispendiosa, já que recairia aos envolvidos as despesas do procedimento arbitral e os custos do processo judicial.

As relações econômicas, contudo, são essenciais para que um país mantenha um saudável fluxo de investimentos. Nesse ponto, os agentes econômicos, após a bem sucedida experiência nos principais mercados internacionais, passaram a exigir que a arbitragem fosse prevista em todas as suas relações comerciais, sobretudo em países emergentes que apresentavam um sistema judiciário ainda bastante moroso, como o caso brasileiro.

A economia, regida por princípios próprios, busca maximizar seus ganhos e ser capaz de prever perdas para o planejamento da atividade. Essa tarefa é bastante facilitada em países que apresentam uma organização segura quanto à utilização da arbitragem privada. Nesse contexto, o ordenamento jurídico brasileiro passou a acolher o instituto como um meio de resolução de disputas que envolvam direitos patrimoniais disponíveis, assim como ocorre com os conflitos empresariais.

A atuação do legislador brasileiro representou um substancial avanço para o cenário vivido no país naquele momento, configurando uma medida de fomento e indução de investimentos, especialmente estrangeiros, uma vez que os empresários das principais economias mundiais exigiam essa postura dos países que almejavam receber injeção de recursos. Desse modo, seguindo o mesmo raciocínio, a Lei n° 9.307, de 23 de setembro de 1996 ? Lei de Arbitragem foi reforçada no ano de 2015 pelo advento da Lei n° 13.129, de 26 de maio, tendo sido aprimorada pelo legislador ao receber novas ferramentas que fortalecem a via arbitral e a tornam ainda mais segura.

A presente pesquisa terá como ponto de partida a análise do planejamento estatal sobre a organização da atividade econômica, sendo ressaltadas as características que tornam a arbitragem privada uma ferramenta importante na atração de investimentos estrangeiros para o país. Em seguida, o processo arbitral é examinado detalhadamente, com o objetivo de demonstrar sua melhor aderência às necessidades do mercado privado.

Por derradeiro, as recentes inovações promovidas pelo legislador são destacadas e analisadas, demonstrando-se especificamente as consequências favoráveis ao fortalecimento da arbitragem em território nacional.

No que diz respeito à metodologia adotada, o artigo que aqui se apresenta tem viés exploratório e descritivo. Está ancorado em uma abordagem qualitativa e partiu da análise de documentos e de observações da realidade que foram confrontados com a recente doutrina sobre o tema e a legislação vigente.


1 O DEVER DO ESTADO EM FOMENTAR A ATIVIDADE ECONÔMICA


A sociedade capitalista é nitidamente marcada pela intensificação da competição empresarial, resultando em uma constante busca pela redução de despesas e otimização da aplicação de recursos financeiros. O objetivo de lucro, contudo, não deve ser compreendido como uma finalidade prejudicial à coletividade. Em verdade, o ambiente de mercado tende a gerar o aperfeiçoamento dos produtos e serviços prestados, assim como o barateamento de preços e geração de empregos. Logo, a consequência natural de uma salutar atividade empresarial seria o benefício da própria sociedade.

O Estado tem o dever de planejar o desenvolvimento da atividade econômica , impedindo abusos indevidos e delimitando quais são as áreas que necessitam de exploração direta do ente público e quais são aquelas em que a iniciativa privada poderá investir os seus ativos. Esse projeto econômico deve estar em consonância com o princípio da subsidiariedade , o qual estabelece que o Estado atuará na economia exclusivamente nas hipóteses de necessidade pública e imperativo de segurança nacional. Assim, a inocorrência das referidas hipóteses indica a abertura de um determinado ramo ao empresariado.

A regulação da ordem econômica é uma importante, porém não única, faceta do modelo de administração pública gerencial adotado no país. O fomento à iniciativa privada é um dos elementos essenciais para o estímulo do desenvolvimento da atividade empresarial (MOREIRA NETO, 2008, p. 133), podendo ser realizado das mais variadas formas. O ato estatal deve ter como ponto central a criação de incentivo ao particular, tornando o ambiente mais favorável através da diminuição de riscos ao empreendedorismo.

Uma maneira eficaz de estimular o aquecimento da economia é a previsão de mecanismos adequados para a solução dos conflitos empresariais, ampliando o rol de opções da iniciativa privada quanto aos meios a serem utilizados no deslinde das questões que surjam das relações comerciais.

Nessa linha, a instituição da arbitragem no ordenamento jurídico brasileiro representou a consolidação de um método célere, técnico e previsível de solução das controvérsias entre particulares, conferindo segurança jurídica aos olhos dos investidores e, por conseguinte, gerando grande atratividade de investimentos.

O panorama que se tinha antes da edição da Lei n° 9.307/96 caracterizava-se por não conferir exequibilidade ao laudo arbitral, exigindo-se que a parte interessada buscasse a homologação judicial da decisão para, posteriormente, ajuizar uma eventual demanda executiva. Desse modo, nota-se que a previsão de um sistema alternativo ao processo judicial não tinha grande efetividade prática, já que a escolha pelo mecanismo da arbitragem teria consequências apenas no início do conflito, podendo a matéria ser rediscutida ao fim no Poder Judiciário.

A Lei de Arbitragem teve a virtude de cristalizar o instituto no ordenamento jurídico pátrio e, ainda, robustecer suas engrenagens para conferir maior credibilidade ao seu funcionamento. Com efeito, após o referido normativo o laudo arbitral passou a ser considerado um título executivo judicial, com os mesmos efeitos da decisão prolatada por um órgão do Poder Judiciário . Nesse ponto, a autonomia da vontade ganha especial importância, pois é reconhecido pelo Estado que os particulares podem escolher a melhor forma de solucionar os seus conflitos, não sendo uma exclusividade do poder público a distribuição da justiça em casos relacionados a direitos patrimoniais disponíveis.

A arbitragem, muito embora já estivesse amplamente difundida e enraizada no mercado internacional, ainda não apresentava a mesma segurança no sistema jurídico nacional. Desse modo, o acolhimento desse mecanismo de resolução de conflitos serviu de sinalização aos investidores internacionais sobre o interesse brasileiro em implantar um ambiente mais livre de comércio, podendo as partes optar pelos meios que entenderem mais adequados para a pacificação de seus litígios.

Essa intenção foi reforçada após a edição da Lei nº 13.129, de 26 de maio de 2015, a qual modificou algumas disposições da Lei nº 9.307/96, modernizando a Lei da Arbitragem e tornando sua aplicação ainda mais sólida na realidade brasileira.


2 A ARBITRAGEM PRIVADA COMO ESCOLHA DO JURISDICIONADO


Antes de iniciar-se a conceituação da arbitragem privada, cumpre esclarecer que não serão abordadas neste trabalho as especificidades referentes à utilização do referido instituto na esfera pública. Isso porque, todo e qualquer ato realizado pelo Estado deve estar em conformidade com os princípios que regem a Administração Pública, acarretando em algumas modificações na sistemática da arbitragem e impondo ressaltar suas distinções no caso concreto. Assim, a presente análise estará focada na utilização da arbitragem como ferramenta de indução e fomento a investimentos estrangeiros no país.

A arbitragem privada constitui ?instituto pelo qual as pessoas capazes de contratar confiam a terceiros (árbitros), por ela indicados ou não, a pacificação de seus litígios relativos a direitos disponíveis? (GUILHERME, 2016, p. 64). Em outras palavras, a arbitragem é um método heterocompositivo de solução de controvérsias escolhido pelas partes, as quais delegam a um terceiro (julgador técnico) o dever de decidir sobre a celeuma.

A arbitragem deverá versar sobre direitos patrimoniais disponíveis, uma vez que sobre esse assunto cada particular deve ser capaz de decidir o melhor rumo para a resolução dos problemas surgidos de suas relações jurídicas. Assim, tendo em vista que a adoção da arbitragem é uma faculdade das partes, é possível afirmar que sua existência no sistema legal brasileiro depende dos benefícios que ela poderá oferecer àqueles que optarem pela sua utilização.

É justamente a comparação entre a arbitragem e os demais métodos existentes para solução de conflitos que determinará sua solidez na prática de mercado e, consequentemente, reforçará a necessidade de garantir sua segurança através da previsão legal.

Nota-se que a distribuição da justiça não pode ser entendida como uma função exclusiva a ser desempenhada pelo Estado, mas sim como uma finalidade que pode ser alcançada de diversas formas. A doutrina denomina esse sistema de organização do acesso à justiça como "sistema multiportas" (OLIVEIRA; SPLENGER, 2013, p. 70), o qual se caracteriza por reservar ao indivíduo a escolha pela melhor forma de resolver os impasses oriundos de suas relações interpessoais ou contratuais. O jurisdicionado passa a ser visto como um elemento participativo do sistema.


3 AS VANTAGENS INERENTES À ARBITRAGEM


As vantagens da arbitragem são inerentes ao seu próprio processo. É necessário que a análise quanto à sua utilização no caso concreto tenha como parâmetro os objetivos a serem alcançados pelas partes. Por exemplo, se as pessoas envolvidas tiverem o interesse de manter em sigilo as informações discutidas no conflito, a arbitragem poderá prever esse efeito ao procedimento. Nesse sentido, é importante analisar as principais características do processo arbitral para que, posteriormente, seja possível compreender os motivos que levaram as partes a escolherem esse meio de resolução de controvérsias.


3.1 A segurança oriunda da tecnicidade da decisão a ser proferida


O terceiro que proferirá a decisão no processo arbitral é, em regra, um profundo conhecedor da matéria que será colocada em exame . O laudo arbitral estará amparado tanto na legitimação conferida pela escolha das partes quanto no comprovado conhecimento do árbitro sobre o objeto em discussão.

A tecnicidade da decisão é justamente uma característica do processo arbitral, um dos pontos centrais de diferenciação com o processo judicial. O Poder Judiciário oferece ao jurisdicionado um julgador genérico, muitas vezes sem o conhecimento específico da área de atuação dos particulares, o que resulta em uma considerável imprevisibilidade quanto ao desfecho do processo. Assim, a previsibilidade de um laudo técnico torna-se uma considerável atratividade da arbitragem frente aos demais métodos de resolução de controvérsias.

Nessa linha, é importante destacar que a arbitragem poderá ser prevista pelas partes em dois momentos distintos. Caso o procedimento seja definido em lapso temporal anterior ao conflito, será realizado através da cláusula compromissória. Contudo, na hipótese da arbitragem ser definida após o surgimento da lide, a formalização será celebrada mediante o compromisso arbitral. A separação de um e outro instrumento se faz necessário, pois apenas a cláusula compromissória abarcará os modelos de previsão ?cheia? ou ?vazia? (GUILHERME, 2016, p. 80).

A cláusula ?cheia? caracteriza-se como o acordo de vontades através do qual as partes elegem a arbitragem como meio de solução de conflitos futuros, contendo o estabelecimento de todos os elementos para a instituição do procedimento, podendo existir previsão quanto às regras, provas, indicação de árbitros ou câmaras de arbitragem, entre outros. Por sua vez, a cláusula denominada ?vazia? também prevê a arbitragem como solução de uma lide entre as partes, porém não traz os elementos essenciais para o início do processo arbitral, sendo necessário que os particulares, quando da ocorrência do conflito, complementem seu acordo de vontades e apresentem as regras da arbitragem, indicação de árbitros e etc. É justamente pela ausência de definição quanto aos elementos estruturantes da arbitragem que a doutrina (CARMONA, 2009, p. 112) costuma denominar a cláusula compromissória vazia como ?cláusula arbitral patológica?, já que necessitará de posterior complemento para sua eficácia.

Em razão da segurança conferida pela cláusula compromissória cheia, é importante salientar que esse instrumento é utilizado na grande maioria dos contratos firmados no mercado.


3.2 A maior celeridade do processo arbitral


A arbitragem tem por característica a acentuada celeridade de seus procedimentos, seja por conta da ausência da burocracia pública seja pela concentração de atos e regulamentação prévia sobre os prazos e fases do processo . Além disso, a boa fundamentação das decisões proferidas em âmbito arbitral, mesmo que incidentais na discussão, geram uma aceitabilidade maior pelas partes, evitando-se impugnações que possam procrastinar o feito. O mesmo pode ser dito sobre a exequibilidade das decisões arbitrais, já que o fato de decorrerem da escolha das partes faz com que suas determinações apresentem substancial cumprimento voluntário dos envolvidos.

A maior celeridade, contudo, não deve ser confundida com o barateamento dos custos. Em regra, a arbitragem é um instrumento que exige um alto investimento das partes, porém é bastante confiável no mercado. Assim, os particulares acabam por preferir a previsibilidade do processo arbitral em detrimento das incertezas provenientes de um processo judicial comum.


3.3 A maior flexibilidade dos procedimentos e a democracia do processo


A Lei nº 9.307/96 prevê em seu art. 21 que as partes poderão estabelecer o procedimento arbitral, podendo ele reportar-se ao código de atos processuais que rege um determinado órgão arbitral ou ficar a cargo do árbitro eleito. Essa disposição retrata a grande liberdade conferida aos particulares, pois ao escolher de forma prévia o árbitro que julgará a questão, poderão os envolvidos determinar um procedimento especialmente célere com o julgador, a depender do caso em análise.

Corroborando com esse raciocínio, o art. 2º desta Lei dispõe que as partes determinarão se a arbitragem convencionada será de direito ou de equidade. Nesse ponto, saliente-se que a diferença existente nos mencionados modelos de arbitragem está calcada na decisão sobre o caso, a qual poderá estar fundamentada na lei escolhida pelos envolvidos (arbitragem de direito) ou nos princípios gerais de direito, usos, costumes e regras internacionais de comércio (arbitragem de equidade). Assim, a única ressalva é de que a arbitragem não poderá violar os bons costumes e a ordem pública.


3.4 O sigilo da arbitragem


Uma das principais atratividades da arbitragem é a possibilidade de estipulação do sigilo durante todo o procedimento arbitral e, ainda, do laudo que posteriormente decidirá sobre o conflito. A confidencialidade é uma notável vantagem para grandes empresas, pois ao mesmo tempo em que pode ser utilizado para resguardar os segredos de seu empreendimento (como tecnologia, linhas de montagem, desenhos industriais, estratégias de investimentos, dentre outros), poderá também servir para evitar difusão de informações negativas à imagem da empresa.

O sigilo do processo arbitral caminha em sentido diametralmente oposto ao princípio da publicidade que informa o processo judicial. Desse modo, caso não seja concedido ao caso segredo de justiça , os detalhes do processo poderão ser acessados por qualquer indivíduo, podendo gerar efeitos negativos às relações comerciais dos envolvidos.


3.5 Irrecorribilidade da sentença arbitral


O laudo arbitral pacificará o conflito de interesses levados a conhecimento do julgador e terá a mesma validade de uma sentença judicial transitada em julgado e exarada por um órgão do Poder Judiciário. A arbitragem não apresenta a regra (alguns denominam de princípio) do duplo grau de jurisdição que norteia o processo civil, tendo, de plano, a eficácia em caráter absoluto e possibilidade de ser executada em caso de negativa pela parte derrotada.

Essa característica da arbitragem tem extrema importância, uma vez que são os inúmeros recursos do processo judicial comum que acabam por impulsionar os empresários a buscarem na arbitragem um meio mais célere e adequado ao deslinde de suas controvérsias.


4 A ADEQUAÇÃO DA ARBITRAGEM AO RAMO EMPRESARIAL


As características da arbitragem demonstram que seu funcionamento é mais aderente às necessidades das relações econômicas, gerando uma grande atratividade para sua escolha no ramo empresarial. Em um ambiente de competição acirrada, é natural que os agentes econômicos escolham formas de evitar perdas financeiras, agilizando disputas comerciais e adotando um sistema confiável de solução de conflitos.

As vantagens já destacadas no presente trabalho fizeram com que o Estado acolhesse o processo arbitral como forma de fomento da atividade econômica no país, já que a atratividade desse mecanismo de resolução de controvérsias apresentou-se mais eficaz do que o sistema judicial oferecido pela máquina pública. Dessa maneira, em um ?sistema multiportas? de acesso à justiça, cabe ao particular, imbuído de sua autonomia da vontade, determinar se deseja, ou não, submeter determinados conflitos a um terceiro, normalmente técnico na área em debate.

A doutrina (OLIVEIRA; SPLENGER, 2013, p. 100) aponta que a arbitragem está em pleno crescimento no país, consolidando-se cada vez mais como uma prática em âmbito nacional. Em verdade, as exigências do mercado impuseram a adoção da arbitragem ao empresariado brasileiro e, como não poderia deixar de ser, o Estado buscou consolidar o instituto no ordenamento jurídico pátrio, conferindo mais segurança em suas engrenagens, como já destacado. Uma dessas medidas foi a possibilidade de ajuizamento de demanda judicial com pedido de cumprimento de antecipação de tutela deferida em juízo arbitral. Assim, embora a arbitragem esteja desprovida do poder de coerção estatal, poderá o particular socorrer-se da decisão provisória para ajuizar demanda judicial que requeira seu cumprimento.

A melhor compreensão da adoção da arbitragem como fomento e indução de investimentos estrangeiros no Brasil depende da análise quanto aos princípios que regem a economia, eis que esclarecedores para o entendimento de escolhas pelas melhores alocações de recursos por investidores.


4.1 A consolidação da arbitragem privada em razão da economia


Os investimentos realizados em ambiente econômico são precedidos de uma análise técnica sobre circunstâncias que podem influenciar na sua rentabilidade, como a entrada de um concorrente na área, os custos de regularização da atividade em virtude da burocracia estatal, a necessidade de contingenciamento de verbas, entre outros. Com efeito, a economia há muito tem como ponto de estudo a atividade humana como consequência de estímulos que lhe são proporcionados, sejam eles oriundos do próprio mercado ou fruto de políticas públicas.

Nessa linha, cumpre esclarecer os conceitos dos princípios econômicos básicos, com o objetivo de compreender plenamente a sistemática que permeia a realização de uma aplicação financeira.


4.2 Os princípios gerais e as regras básicas que regem a economia


O primeiro princípio a ser destacado nesse ?apanhado básico? sobre as normas que regem o mercado é a maximização de utilidades pelo ser humano (BOARATI, 2006, p. 38). Esse princípio estabelece que todas as pessoas têm interesse em aumentar sua utilidade com a menor quantidade de esforço ou recursos a serem despendidos para tanto. Essa é uma regra absoluta na atividade econômica, pois todo ato contrário a essa lógica deve ser entendido como uma benesse conferida pelo agente, um ato de caridade, já que não estaria aumentando sua utilidade com a medida.

É justamente por ter esse objetivo que o homem reage a incentivos, sendo encarado pela economia como um ser eminentemente racional. Logo, se há interesse que o indivíduo realize determinada ação, é preciso que certos estímulos sejam criados para direcionar sua vontade para esse viés.

O fluxo de investimentos em um mesmo sentido tem o resultado de ditar os rumos econômicos do mercado. Esse princípio tem como base a própria noção de oferta e demanda, uma vez que há incentivos para a produção e oferta de bens desejados pela sociedade, enquanto há um proporcional desestímulo ao desperdício de recursos em bens pouco valorizados.

Ademais, o preço de um bem sinaliza ao seu produtor toda a informação que este necessita para decidir produzir mais daquele produto ou, pelo contrário, interromper a produção do mesmo. Assim, não cabe aos governos estabelecerem o preço ou as quantidades a serem produzidas, uma vez que estas interferências desregulam os mercados. Esse é o princípio da ?mão invisível? (BOARATI, 2006, p. 24), assim denominado por Adam Smith, tendo como máxima a afirmação de que o mercado se autorregula.

A experiência das principais economias mundiais já revelou que o mercado não pode ser totalmente desregulado (OLIVEIRA; SPLENGER, 2013, p. 40). Os empresários tendem a cometer atos atentatórios à concorrência e tendenciosos à criação de um mercado exclusivo para si ou de irrestrita exploração ao consumidor. Nesse contexto, cabe ao poder público regular a atividade econômica, evitando os abusos que podem ser cometidos e zelando por uma saudável competição entre as empresas.

Nota-se que as estabilidades política e jurídica estão intimamente ligadas à atração de recursos dos agentes econômicos. A previsibilidade do ambiente de investimentos, somada à adoção de políticas de desburocratização das amarras do Estado, sejam elas de processos judiciais ou de regulação da atividade, corroboram para o crescimento das aplicações financeiras.

Em apertada síntese, os princípios e regras básicas que regem a economia direcionam os empresários a buscarem sempre um local mais seguro para a alocação de seus recursos. É nesse sentido que caminha a adoção da arbitragem na experiência brasileira, pois, com o objetivo de promover as mesmas condições existentes em outros mercados, o ordenamento jurídico pátrio buscou aperfeiçoar seu sistema, tornando-o menos burocrático e mais eficiente.


4.3 A importância do fortalecimento legislativo da arbitragem na atração de investimentos


Conforme exposto ao longo do primeiro capítulo deste trabalho, a arbitragem foi instituída no sistema jurídico brasileiro através da edição da Lei nº 9.307/96, conferindo grande valor à autonomia das partes, as quais teriam, a partir daquele momento, a possibilidade de escolha pela resolução de seus conflitos patrimoniais mediante a utilização do referido instrumento.

Muito embora a previsão legal da arbitragem fosse um substancial avanço à época, sobretudo considerando o grande anseio da iniciativa privada para que a sua utilização tivesse amparo na legislação, as controvérsias quanto à aplicação do instituto não terminaram. Ao contrário, o fato de que o normativo criado pelo Estado não trazia todas as respostas aos operadores do direito servia de argumento para insuflar críticas e receios para a plena utilização do instituto. Isso porque, muitas das problemáticas surgidas durante um processo arbitral demandavam o ajuizamento de um processo judicial, fragilizando por demais o instituto como um meio independente de solução de conflitos.

A Lei nº 13.129/15 teve o condão de consolidar a arbitragem no ordenamento jurídico pátrio, eis que modernizou as engrenagens do instituto e trouxe respostas a diversos questionamentos que colocavam o procedimento em xeque no passado. Nesse ponto, a Lei passou a trazer diversas previsões que modificaram a arbitragem, tornando-a um instrumento com mais suporte jurídico, protegendo, por conseguinte, seus usuários.

Por exemplo, a citada norma introduziu os arts. 22-A e 22-B na Lei nº 9.307/96, os quais inauguraram a possibilidade de serem deferidas tutelas cautelares e de urgência antes da instauração da arbitragem. Assim, caso o particular entenda que seu direito sofre ameaça da parte contrária, e, por tal razão, não sendo viável aguardar o trâmite comum do início de uma arbitragem, é possível requerer a medida de forma judicial, valendo a decisão apenas para salvaguardar o referido direito.

Nos termos do que ensina a doutrina (GUILHERME, 2016, p. 91), a matéria principal será conhecida e julgada pelo árbitro, assim como dispõe as normas do processo arbitral. Em verdade, a hipótese em comento versa apenas sobre a necessidade de tutela cautelar e de urgência prévias ao procedimento, caso contrário o próprio juízo arbitral poderá conhecer e julgar o pedido.

A inovação é importante e apresenta-se muito bem-vinda na prática, pois regulamenta com precisão os procedimentos a serem tomados. O dispositivo é específico ao determinar que a medida judicial será cabível apenas quando a arbitragem não houver sido instaurada, fixando, ainda, o prazo de validade da decisão e a necessidade de confirmação da medida pelo árbitro competente.

Na hipótese da arbitragem já iniciada, o julgador tomará conhecimento do pedido cautelar ou de urgência de uma das partes e decidirá sobre o tema. O cumprimento, em regra, ocorre de forma espontânea, já que as partes optaram voluntariamente por este mecanismo de solução de conflitos. No entanto, mesmo que haja a necessidade de realizar-se o cumprimento forçado de uma decisão cautelar ou de urgência na arbitragem, a legislação previu a carta arbitral como forma de comunicação entre o juízo arbitral e o poder judiciário.

O art. 22-C da Lei nº 9.307/96 estabelece que o árbitro poderá requerer ao juízo estatal a realização de determinado ato dentro de sua jurisdição, utilizando-se do poder de império do ente público, isto é, imposição estatal para fazer valer o pleito determinado pelo árbitro. Assim, percebe-se que o sistema de tutelas cautelares e de urgência ganhou especial atenção pelo legislador, conferindo substancial segurança aos particulares que escolherem a via arbitral para a pacificação de seus impasses comerciais. Outros exemplos emblemáticos de fortalecimento da arbitragem no ordenamento jurídico brasileiro são a interrupção da prescrição e a previsão da sentença parcial.

A interrupção da prescrição sendo fixada no momento do requerimento para início da arbitragem acabou com uma longa divergência doutrinária sobre a extensão dos efeitos retroativos, ou seja, o momento exato em que a prescrição restaria interrompida. Desse modo, o marco fixado para a instauração da arbitragem tem o condão de proteger os particulares, pois interrompe o prazo prescricional, não permitindo o seu transcurso mesmo na hipótese de ausência de jurisdição dos árbitros .

A previsão da sentença parcial está em consonância com a moderna doutrina do direito processual civil, eis que permite ao julgador (juiz estatal ou árbitro) a tomada de decisão sobre um ponto que tenha formado seu convencimento, sem comprometer-se com o imediato julgamento integral da causa. A sentença parcial agiliza o processo, esteja ele em trâmite no poder judiciário ou em via arbitral. Nesse ponto, a grande preocupação existente em parte da doutrina versava sobre a possibilidade de prolação de uma sentença incompleta. No entanto, essa hipótese foi totalmente rechaçada pelo art. 33, §4º da Lei nº 9.307/96, o qual previu que a parte interessada poderá ingressar com ação judicial com o objetivo de requerer a complementação da decisão arbitral.

Nota-se que o ordenamento jurídico brasileiro partiu da ausência de previsão legal quanto aos procedimentos da arbitragem para uma situação de franco fortalecimento do instituto. O Poder Judiciário, abarrotado de demandas e extremamente burocrático, não é capaz de dirimir os conflitos que possam surgir na intensa e imediata relação comercial dos tempos atuais. O processo judicial caracteriza-se pela morosidade e não especialização do julgador (órgão de conhecimento generalista), o que não transmite confiança, tanto ao cidadão comum quanto ao empresariado.

O fenômeno que se presencia é o da fuga em relação ao Poder Judiciário. Os indivíduos que entendem existir outro mecanismo de solução de controvérsias mais adequado ao seu caso optam por este ao invés de um processo judicial (como negociação, conciliação, mediação ou arbitragem). É claro que esse ainda é um movimento tímido, sobretudo em um país pautado pela observância de direitos somente em casos de ameaça de ajuizamento de uma demanda judicial. O acesso à justiça ainda depende, em um grau elevado, da atuação do Poder Judiciário, porém o país inicia um caminhar no sentido da solução consensual de celeumas entre particulares, tornando o povo mais maduro e capaz de resolver os impasses do cotidiano.

Nessa linha, a arbitragem é um instrumento que valoriza a autonomia da vontade, prevendo a possibilidade de definição do procedimento, da pessoa do árbitro, dos elementos probatórios, fixação de um eventual prazo de decisão, entre outros. A flexibilidade do mecanismo, aliado à sua previsibilidade pelos usuários, acabam por apresentá-lo como um meio adequado ao alcance da pacificação dos conflitos comerciais.

As leis de mercado direcionam o agente econômico a alocar os seus recursos onde lhe pareça ser um local propício para tal. Essa análise passará pela observação do ambiente político e jurídico do local de investimento, buscando-se aferir se o local é estável, se apresenta celeridade no julgamento de possíveis conflitos, se tem um ordenamento jurídico seguro no que se refere às relações comerciais, entre outros fatores já esmiuçados. Além disso, é importante ressaltar que a arbitragem é um instrumento bastante difundido no mercado internacional e, portanto, sendo um instrumento consolidado na legislação brasileira, a consequência natural será de um ambiente seguro para a aplicação de recursos.

Logo, a associação da consolidação da arbitragem ao aumento de investimentos estrangeiros é uma lógica legítima. Em verdade, o simples fato de o Brasil ter se adaptado a uma condição imposta pelo mercado internacional já revela o desejo em fomentar a atividade econômica, nos termos do que dispõe o art. 173 da Constituição Federal.


CONCLUSÃO


A consolidação da arbitragem na experiência jurídica brasileira representou uma verdadeira sinalização do governo no sentido de atrair recursos e aquecer a economia do país. O fomento e indução de investimentos estrangeiros passam pela correta leitura do mercado e tomada de decisões, com o objetivo de construir um ambiente favorável e seguro para aplicação de ativos.

Nesse contexto, com base no comando constitucional, o poder público concretizou o fortalecimento do processo arbitral e passou ao jurisdicionado a escolha de utilizar o melhor meio capaz de alcançar a pacificação da lide. A distribuição da justiça não é uma prestação exclusiva do ente estatal, sendo possível que cada indivíduo, no que tange aos seus direitos patrimoniais disponíveis e exercitando sua autonomia, opte pela via que entender mais benéfica. Aliás, sobre esse assunto ? patrimônio ? ninguém melhor do que o próprio particular para definir os rumos a serem tomados.

Portanto, andou bem o legislador ao robustecer as previsões referentes à arbitragem no ordenamento jurídico brasileiro, pois trouxe uma segurança ainda maior aos seus usuários. Essa atitude, além de reconhecer a maturidade do particular em resolver seus próprios problemas, auxiliou ainda na atração de investimentos estrangeiros na economia, já que ajudou a construir uma imagem mais segura quanto ao funcionamento do instituto no Brasil, transmitindo confiança ao mercado.


REFERÊNCIAS


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BRASIL. Lei n° 9.307, 23 de setembro de 1996. Dispõe sobre a arbitragem. Diário Oficial da União. Brasília, 23 de setembro de 1996.

  . Lei n° 13.129, 26 de maio de 2015. Altera a Lei n° 9.307, de 23 de setembro de 1996, e a Lei n° 6.404, de 15 de dezembro de 1976, para ampliar o âmbito de aplicação da arbitragem e dispor sobre a escolha dos árbitros quando as partes recorrem a órgão arbitral, a interrupção da prescrição pela instituição da arbitragem, a concessão de tutelas cautelares e de urgência nos casos de arbitragem, a carta arbitral e a sentença arbitral, e revoga dispositivos da Lei n° 9.307, de 23 de setembro de 1996. Diário Oficial da União. Brasília, 26 de maio de 2015.

  . Lei n° 13.105, 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Diário Oficial da União. Brasília, 16 de março de 2015.

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